quinta-feira, fevereiro 14, 2013

Kazemakase Tsukikage Ran (TV)

OBS: Resenha publicada originalmente no Animehaus em 01/01/2004.

Alternativos: Carried by the Wind: Tsukikage Ran, Samurai Girl Ran
Ano: 2000
Diretor: Akitaro Daichi
Estúdio: Madhouse
País: Japão
Episódios: 13
Duração: 30 min
Gênero: Aventura / Comédia / Histórico


Tsukikage Ran é uma bela samurai, de cara fechada e que odeia ser perturbada na hora de seu sono sagrado. Interesseira, Ran não mede esforços para bajular quem quer que seja, desde que possa, com isto, se esbaldar de tanto comer ou cair dura de tanto beber saquê quente! ^__^ Ran viaja sem rumo pelo mundo ("Kazemakase", por sinal, quer dizer "por onde o vento sopra" ^__^), dormindo em baixo de algumas árvores, enchendo a barriga de comida e saquê e, claro, detonando alguns homens no meio do caminho. ^_^

Durante sua caminhada, Ran acaba conhecendo Lady Meow do Punho do Gato de Ferro (!!), uma bela artista marcial com cérebro de minhoca, mas que luta como poucos e viaja em busca de "alguma coisa". Após detonarem um bando de desocupados, Ran e Meow acabam viajando juntas, cada uma por razões diferentes: Meow, porque enxerga Ran como uma irmã mais velha; e Ran, porque enxerga Meow como uma fonte inesgotável de comida e saquê gratuitos! ^^" Fácil perceber que muita confusão irá acontecer com esta dupla inusitada!

Kazemakase Tsukikage Ran (para facilitar, KTR) é uma produção da Madhouse e Bandai Visual, e foi feita praticamente pela mesma equipe responsável por Jubei-chan, a começar pelo diretor Akitaroh Daichi. Não é à toa que KTR guarda tantas semelhanças com Jubei-chan, a começar pelas animação fantástica, especialmente durante as lutas. O humor escrachado também está presente a todo o momento, seja com os comentários idiotas de Meow-chan, seja com a cara de porta e as alfinetadas certeiras de Ran.


Tecnicamente, KTR é tão bem feito que nem parece uma série para TV (nenhuma novidade, em se tratando da Madhouse). Desde o excelente "Chara Design" até as lutas antológicas, não existe um momento sequer no qual a qualidade técnica da série decepcione. A trilha sonora tradicional, apesar de não ser muito marcante, é perfeita como pano de fundo, e a música de abertura, "Kazemakase", cantada por Misawa Akemi, possui uma letra hilária! ^___^

Ran é uma personagem fantástica! Sem papas na língua e com um senso de justiça muito peculiar, Ran trata o saquê como "algo divino" e, assim como Kenshin Himura, não mata seus oponentes durante as lutas, virando a espada e batendo com as costas da lâmina na hora do "golpe de misericórdia". Bonita e boa de briga, Ran possui uma sensualidade diferente da que estamos acostumados a ver... talvez por isto mesmo ela seja tão atraente! ^__^ Meow, por outro lado, desperta emoções conflitantes no espectador a todo momento. É simpática, tem um coração de ouro, mas é imbecil ao extremo e muuuuuuito chatinha, com uma voz estridente de fazer inveja a Excel! ^__^ Não dá para negar que ela é muito engraçada, mas na maior parte do tempo ela é realmente irritante, com toda a gritaria que faz.

Quanto à história, KTR deixa um pouco a desejar, já que praticamente não existe um enredo central. Cada episódio possui uma história específica, exceto no final, quando um pouco do passado de Ran vem à tona. Esta falta de uma história forte, aliada ao ritmo irregular e à chatice de Meow, faz com que KTR se torne uma série um pouco cansativa em alguns momentos.



Kazemakase Tsukikage Ran é uma série com ótimos momentos cômicos e algumas das melhores lutas de espada já mostradas em um anime feito para a TV, mas que teria sido muito melhor sem a chatice de Meow. Ainda assim, não dá para negar que é muito legal assistir a um anime no qual duas belas mulheres sentam a mão sem dó nos homens maus!! ^__^"


Marcelo Reis


 

Kaiba (TV)

OBS: Resenha publicada originalmente no Animehaus em 04/02/2011.

Ano: 2008
Diretor: Masaaki Yuasa
Estúdio: Madhouse
País: Japão
Episódios: 12
Duração: 24 min
Gênero: Aventura / Drama / Sci-Fi


A morte de Satoshi Kon em agosto de 2010, com apenas 46 anos, e a idade cada vez mais avançada de grandes diretores como Hayao Miyazaki, Isao Takahata e Rintaro deixa os fãs de animes com a pulga atrás da orelha. Claro, ainda há muita gente boa das antigas em atividade (Mamoru Oshii, Katsuhiro Otomo, Yoshiaki Kawajiri) e que terá, em tese, uma longa estrada pela frente. Mas, e a longo prazo? Em quem podemos apostar como possíveis sucessores destes nomes consagrados? Muito se fala dos independentes Makoto Shinkai (Hoshi no Koe) e Shuhei Morita (Freedom), além de outros ligados a grandes estúdios, como Kenji Kamiyama (GITS-SAC, Higashi no Eden), Mamoru Hosoda (Toki wo Kakeru Shoujo, Summer Wars) e Kenji Nakamura (Mononoke, Kuuchuu Buranko). Difícil imaginar esta lista sem a presença de Masaaki Yuasa (MindGame, Kemonozume, The Tatami Galaxy), que sempre consegue imprimir uma marca visual e narrativa inconfundível às suas obras.

"Kaiba" é mais um anime dirigido por Masaaki Yuasa, baseado numa idéia original do próprio diretor. A história se passa num mundo no qual as memórias e personalidades das pessoas ficam contidas num triângulo enfiado no topo da cabeça. Os ricos vivem bem no alto, mergulhados na opulência e nas drogas, enquanto os pobres vivem embaixo, na miséria, separados dos ricos por nuvens elétricas que não podem ser atravessadas, sob pena de terem seus triângulos apagados.

Para completar a desgraça, os pobres são caçados impiedosamente a mando do Rei, uma vez que seus corpos valem muito dinheiro. À medida em que os corpos dos ricos vão envelhecendo, eles precisam de corpos jovens para inserir suas memórias neles e, assim, continuarem a viver eternamente. Parentes vendem parentes por puro interesse financeiro, enquanto outras pessoas vendem os próprios corpos para ajudar as famílias, na esperança de que possam renascer num novo corpo. Mas, infelizmente, este é um triste universo no qual todas as lembranças e experiências de vida de uma pessoa não valem simplesmente nada, e podem ser apagadas e modificadas com a mesma rapidez com que editamos arquivos em nosso computador. E com bancos de dados simplesmente lotados, "pessoas" são "apagadas" com a maior naturalidade.

É neste mundo que acorda Kaiba, um garoto de cabelos verdes com um estranho buraco no peito e um pingente no pescoço, contendo a foto de uma mulher desconhecida. Mas o que mais chama a atenção em Kaiba é o fato de ele não possuir memória alguma, algo inimaginável neste universo. E à medida em que acompanhamos sua jornada para recuperar suas memórias, num ambiente "sui generis" em que personalidades femininas podem habitar corpos masculinos, e vice-versa, ou idosos podem viver em corpos de bebê, vamos sabendo mais e mais sobre o porquê deste mundo funcionar desta maneira, e de que modo Kaiba influenciou (e ainda pode influenciar) o desenrolar dos acontecimentos de forma decisiva.


Tecnicamente, "Kaiba" é mais um trabalho espetacular da Madhouse, com uma animação de fluidez notável, especialmente em se tratando de uma série de TV. Com um visual de cores chapadas e com predominância de tons pastéis, "Kaiba" tem muitas semelhanças estéticas com as antigas obras de Osamu Tezuka, como "Tetsuwan Atom", especialmente o desenho de personagens, a cargo de Nobutaka Ito (Kemonozume). A princípio, temos a impressão de estarmos vendo um mundo de "algodão-doce", por assim dizer, já que tudo é bem arredondado e fofinho. Muita gente acaba não querendo ver este anime justamente em função de seu visual diferente, o que é uma pena, pois este contraste entre visual infantil e temática adulta dá um charme todo especial a "Kaiba". Por exemplo, quando as pessoas tomam um tiro, elas viram uma espécie de "plasta" colorida, e o espectador se assusta ao ver que uma cena nada chocante em termos visuais acaba sendo emocionalmente mais forte justamente em função disto. E isto sem contar as pirações visuais em momentos como a exploração das memórias ou durante tudo o que ocorre em Abipa, o Planeta Utópico. E para quem vê as imagens bonitinhas e não acredita muito quando falo em temática adulta, esperem até ver as cenas de sexo.

Todo o trabalho de som é incrível. Desde a trilha sonora eletrônica piradaça de Kiyoshi Yoshida (Toki wo Kakeru Shoujo) aos efeitos sonoros, tudo combina às mil maravilhas com a proposta visual e narrativa de "Kaiba". E os belos e lentos temas de abertura, "Never", e encerramento, "Carry Me Away", ambos cantados por Seira Kagami, possuem letras que têm tudo a ver com a história (ter alguém ao seu lado, não sentir-se só).

"Kaiba" tem o mérito de ser uma série com um enredo muito complexo sem que, com isto, caia na monotonia e no falatório chato de tantas obras ditas "cabeça". Aqui, emoção, diversão e conteúdo andam juntos, e chega a ser surpreendente que uma obra que ataca em tantas frentes (religião, política, filosofia) consiga fazê-lo de forma tão coerente e agradável. A direção de Masaaki Yuasa alterna com maestria momentos de ação e humor com outros devastadores do ponto de vista emocional. É realmente de partir o coração ver que, num universo em que as memórias podem ser invadidas e modificadas, é quase impossível saber até que ponto determinada pessoa é realmente única. Se as experiências ao longo da vida acabam não valendo grande coisa, qual o motivo para se viver, afinal? A quantidade de perguntas que surgem são para deixar qualquer um tonto. O que é a memória? As pessoas têm uma alma ou suas personalidades são apenas dados? Quem é a garota da foto, e qual a sua importância na trama? Quem, ou o quê, é Kaiba? E felizmente, por mais que o anime pareça confuso em alguns momentos, no fim das contas tudo se explica.



Em minha humilde opinião, "Kaiba" é um anime quase perfeito, que só se perde um pouco quando começa uma certa trama política rumo ao final. Não que ela seja ruim de todo, mas além de ser apresentada de forma meio corrida e com alguns furos, ainda quebra um pouco o ritmo da emocionante jornada de Kaiba. Mas não deixem este comentário de "crítico-cri-cri" desanimá-los. "Kaiba" é um dos grandes animes dos últimos anos, que consegue fazer o espectador pensar, refletir e se emocionar para valer. Se Masaaki Yuasa continuar nesta sequência ininterrupta de boas obras, o futuro será promissor para os fãs de bons animes.


Marcelo Reis


 

Hakuja-Den (Movie)

OBS: Resenha publicada originalmente no Animehaus em 30/08/2008.

Alternativos: Hakujaden; Legend of the White Snake; Panda and the Magic Serpent
Ano: 1958
Diretor: Kazuhiko Okabe / Taiji Yabushita
Estúdio: Toei Animation
País: Japão
Episódios: 1
Duração: 78 min
Gênero: Aventura / Romance / Fantasia


Produzido em 1958, "Hakuja Den" é considerado o primeiro longa-metragem japonês de animação em cores, e foi a segunda animação produzida pelo hoje famoso estúdio Toei Animation (a primeira foi o curta-metragem "Little Kitty´s Graffiti"). Baseado no popular conto chinês "Bai She Zhuan", "Hakuja Den" tem um estilo bem diferente daquele ao qual geralmente associamos os animes, como personagens de olhos grandes e com traços estilizados. Em termos narrativos e visuais, "Hakuja Den" tem mais semelhança com as animações produzidas nos EUA por Walt Disney e Max Fleischer, por exemplo, incluindo a presença de canções e danças que têm importância no enredo.

Numa bela seqüência de abertura simulando um teatro de fantoches de vara, somos apresentados à história de "Hakuja Den". Um garoto compra uma serpente branca e imediatamente eles se tornam amigos. Mas a pressão e a ameaça dos adultos obriga o garoto a se separar de sua grande amiga serpente. Na despedida, ela lhe pede que não se torne um adulto insensível quando crescer, e que continue a ser tão bondoso quanto em sua infância.

Muito tempo depois, um furacão de origem sobrenatural assola a região de Hsi Hu, na China, e em seu rastro surgem duas garotas, a bela Pai Niang e sua ajudante Hsiao Ching. Pai Niang, na verdade, é o espírito da serpente branca que surgiu na Terra em forma humana e quer se reencontrar com o antigo amigo, hoje um belo jovem chamado Hsu Hsien. Sempre acompanhado de seus dois animais de estimação, o panda-gigante Panda e o panda-vermelho Mimi, Hsu Hsien fica intrigado com um instrumento de cordas que parece reverberar ao som de sua própria flauta, e mais intrigado ainda com a bela jovem que leva o tal instrumento. Mas a presença do Reverendo Hokai, um "bonzo" que afasta os seres sobrenaturais da Terra, representa um grande perigo para um possível reencontro entre os dois antigos amigos.

"Hakuja Den" é uma obra que impressiona em termos técnicos com sua excepcional animação e o belo colorido em tons pastéis. Os personagens humanos possuem movimentos suaves e elegantes, enquanto os animais têm um jeitão mais faceiro e brincalhão. Alguns detalhes nos cenários são de encher os olhos, como a perfeição dos reflexos na água e o uso de desfoque, opacidade e transparência para aumentar a sensação de profundidade. E como o enredo é baseado numa obra literária da China, a cultura deste país é muito bem representada através das músicas típicas, dragões, acrobatas com pratos e até mesmo um engolidor de espadas que... bem... só vendo mesmo. Por sinal, muitos devem estranhar porque o Japão escolheu uma obra chinesa para servir como base para sua estréia nos longas de animação. Isto aconteceu porque o Japão adotou uma política de reconciliação pós-guerra com seus vizinhos asiáticos, em especial com a China, algo parecido com a Política da Boa Vizinhança adotada pelo governo norte-americano perante os vizinhos latino-americanos e que levou Walt Disney a criar a obra "Alô Amigos!"


A história simples e inocente versa sobre temas como honra, lealdade, coragem e amizade, mas possui muitos toques de magia e eventos sobrenaturais. Por ser o primeiro longa de animação da Toei, a capacidade de síntese narrativa ainda precisava de alguns retoques. Isto pode ser exemplificado com o uso excessivo de narrações para explicar o enredo, assim como o andamento meio truncado ao longo da obra. O terço final, em especial, é bem arrastado, com eventos visualmente interessantes mas um pouco idiotas e que não levam a nada. Um detalhe muito curioso: apenas dois seiyuus, Hisaya Morishige e Mariko Miyagi, fizeram todas as vozes em Hakuja Den, um feito impressionante.

Os personagens humanos são interessantes, mas o romantismo e o melodrama excessivos atrapalham um pouco, deixando-os um pouco maniqueístas. Hsu Hsien, por exemplo, é bonzinho em excesso e é feito de gato e sapato por quase todo mundo, nunca tomando uma atitude quando necessária. Os personagens animais, por outro lado, são bem mais convincentes, e o anime flui muito melhor sempre que estão em cena. Panda e Mimi são fiéis ao seu amo e fazem de tudo para ajudar o seu reencontro com a serpente branca, e os momentos em que enfrentam uma inusitada gangue de ladrões são, de longe, a melhor parte da obra.

Algumas curiosidades:

-"Hakuja Den" venceu o Prêmio Especial da seção infantil do Festival de Veneza em 1959, e foi o primeiro anime exibido nos EUA, em 1961;

-Um de seus diretores, Taiji Yabushita, acabou dirigindo outros clássicos como Shonen Sarutobi Sasuke, Sinbad no Bouken e Alakazam the Great;

-Na versão americana, o panda-vermelho Mimi foi chamado de gato;

-Por sinal, o panda-vermelho é o símbolo do Mozilla Firefox, pois um de seus nomes em inglês é justamente "firefox".



"Hakuja Den" não chega a ser brilhante em termos de enredo e narrativa, mas a importância histórica deste anime é inegável, pois foi graças a ele que a Toei Doga começou a ser tornar a potência que é hoje e, claro, foi com "Hakuja Den" que a indústria japonesa de animes deu seus primeiros passos. Não menos importante é o fato de vários grandes animadores, como Hayao Miyazaki, Isao Takahata e Rin Taro, terem começado a carreira justamente na Toei, e isto só foi possível graças ao surgimento desta obra tecnicamente primorosa, ainda que inocente e melodramática em demasia.


Marcelo Reis


 

Fallen Art (Movie)

OBS: Resenha publicada originalmente no Animehaus em 09/02/2011.

Alternativos: Sztuka spadania
Ano: 2004
Diretor: Tomasz Baginski
Estúdio: Platige Image
País: Polônia
Episódios: 1
Duração: 6 min
Gênero: Comédia


Tomasz Baginski, diretor de criação do fantástico estúdio de animação polonês Platige Image, tornou-se mundialmente conhecido quando seu curta-metragem "The Cathedral" foi indicado ao Oscar de Melhor Curta-Metragem de Animação em 2003. Logicamente, eram grandes a curiosidade e a expectativa por sua obra seguinte, "Fallen Art", na qual exerceu as funções de diretor, produtor e roteirista.

Com um estilo visual e narrativo totalmente diferente do contemplativo "The Cathedral", "Fallen Art" se passa numa base militar caindo aos pedaços no Oceano Pacífico. Reunidos no topo de uma torre altíssima feita de tábuas mal pregadas, soldados são condecorados por um sargento seboso e enviados a uma derradeira e "honrosa" missão, sacrificando-se em nome da "arte" e da satisfação de seu obeso general.


Em se tratando de uma obra do Platige Image, é óbvio que "Fallen Art" é um deslumbre nos aspectos técnicos. Com um estilo mais cartunesco que o usado em "The Cathedral", "Fallen Art" consegue a proeza de ser ainda mais impressionante nos detalhes das paisagens, dos objetos e, principalmente, dos seres humanos. É sempre grande a dificuldade de se criar personagens vivos em 3D que não pareçam falsos demais, com movimentos mais realistas e um olhar que não pareça vazio, desfocado. Tomasz Baginski conseguiu tal feito, chegando ao ponto de conseguir transmitir uma emoção genuína pelo olhar do general, um ser de aparência grotesca cujos atos combinam perfeitamente com seu visual.

Como em todas as obras do Platige até o momento, não há nenhum diálogo em "Fallen Art", exceto uma pseudo-conversa entre o sargento e um soldado que se resume literalmente a um "blablabla" ininteligível. E ao contrário do hermetismo de "The Cathedral", "Fallen Art" é uma obra mais direta, uma comédia macabra que demonstra como os soldados sempre serão "buchas-de-canhão", seguindo ordens de oficiais com poderes supremos de vida ou morte. Não importa o quão estúpida ou inútil seja a missão, só lhes resta baixar a cabeça e cumprir à risca o que lhes é ordenado. E que jogada de mestre usar a animada música "Asfalt Tango", da banda romena Fanfare Ciorcalia, para retratar algo ao mesmo tempo artístico e brutal.



Vencedor do BAFTA 2006 (Reino Unido) como Melhor Curta-Metragem de Animação e do Golden Horse 2005 (Taiwan) como Melhor Curta Digital, "Fallen Art" continua sendo a obra suprema do Platige Image, pelo menos até que este resenhista possa colocar os olhos nos curtas "The Kinematograph" (2009) e "Paths of Hate" (2010) e, principalmente, no longa-metragem "HARDKOR 44", a ser lançado em 2012. Como este estúdio ainda não conseguiu lançar nenhuma obra de baixa qualidade, o risco de que tais animações sejam ruins é quase nulo. Até lá, fica a recomendação que é quase uma intimação: não deixem de ver "Fallen Art"!


Marcelo Reis


 

Kaidohmaru (OVA)

OBS: Resenha publicada originalmente no Animehaus em 01/04/2009.

Alternativos: Kai Doh Maru
Ano: 2001
Diretor: Kanji Wakabayashi
Estúdio: Production I.G.
País: Japão
Episódios: 1
Duração: 45 min
Gênero: Histórico / Drama / Violência


Aproveitando a comoção causada pela excelência visual do anime "Blood: The Last Vampire", lançado em 2000, a Production I.G. colocou no mercado no ano seguinte outra obra visualmente impactante. "Kaidohmaru" usa a mesma técnica híbrida de 2D e 3D utilizada em "Blood", mas seu estilo visual e narrativo da obra não poderia ser mais diferente. Falar de mistura de 2D e 3D como algo revolucionário numa época em que os videogames se aproximam cada vez mais do fotorrealismo pode parecer exagero. Mas na época de seu lançamento, tanto "Blood" quanto "Kaidohmaru" foram consideradas obras inovadoras em relação à técnica utilizada e aos aspectos visuais. Uma pena que, pelo menos no caso de "Kaidohmaru", o conteúdo da obra ficou longe desta mesma excelência.

Kintoki, também conhecida como Kaidohmaru, é uma jovem garota criada como um menino na época do Japão feudal. Após ter os pais executados por seu próprio tio, Kintoki é acolhida e treinada como soldado por Raikoo-dono durante anos, e desenvolve uma personalidade feroz e indócil. Ela se torna um dos 4 Cavaleiros que guardam a cidade de Kyo. Kintoki, ou Kaidohmaru, sente um amor cada vez maior por Raikoo-dono, situação complicada pelo fato de todos acharem que ela é um homem, e não uma mulher. E a situação torna-se mais complicada com o surgimento da Princesa de Ooni, líder dos "Shuutendooji", um povo rebelde cujos membros se assemelham a demônios e causam doenças estranhas e mortes por onde passam, além de seqüestrarem crianças para serem usadas em sacrifícios. Por algum motivo, a Princesa de Ooni tem uma ligação muito forte com Kintoki, o que adiciona um estranho componente humano em meio à sangrenta batalha entre o Governo Feudal e os "Shuutendooji".


Quem conhece a Production I.G. sabe que eles não decepcionam nos aspectos técnicos, e a qualidade da animação de Kaidohmaru é um primor, mesmo sendo uma obra produzida quase 10 anos antes desta resenha ser escrita. O fato dos personagens terem feições orientais torna mais autêntica a representação do Japão feudal, ao mesmo tempo em que as cores em tons pastéis dão uma atmosfera onírica ao ambiente. Por se tratar de um anime muito violento, é interessante ver o contraste da vermelhidão do sangue que jorra na tela com o colorido suave dos personagens e dos cenários de fundo.

Uma pena que uma obra visualmente impecável tenha uma história muito fraquinha e contada numa narrativa fragmentada e acelerada que não ajuda em nada. Os fatos acontecem muito rapidamente, deixando todo o enredo cada vez mais confuso e sem nexo, algo agravado pela profusão de nomes de personagens e clãs que aparecem o tempo todo.



A impressão é que "Kaidohmaru" foi um projeto pretensioso desde o início, cujo enredo fraco e confuso serve apenas como desculpa para a criação de um anime de visual estonteante e com sangue jorrando em profusão. No fundo, é só uma história de amor confusa num mundo confuso de magia e fantasia, cujo enredo confuso descamba num final podre... e confuso.


Marcelo Reis


 

Jagainu-kun (TV)

OBS: Resenha publicada originalmente no Animehaus em 13/04/2008.

Alternativos: Dogtato-kun
Ano: 2004
Diretor: Yutaka Kagawa
Estúdio: Studio Egg
País: Japão
Episódios: 26
Duração: 3 min
Gênero: Aventura / Infantil / Fantasia


Mais um anime bem infantil e simples, que segue a linha do cultuado "Kogepan". Jagainu-kun conta a história do personagem homônimo que, conforme o seu nome em japonês indica, é um cão-batata, com direito até mesmo a uma cauda com folha e flor. Vivendo na "Cidade dos Vegetais", Jagainu-kun acaba conhecendo Haripoteto, uma porco-espinho-batata muito lindinha. Com o tempo, acaba surgindo um certo clima entre ambos, que passam o tempo conhecendo um pouco mais a região, vendo o que fazem as outras criaturas que ali vivem e formando novas amizades.

E que criaturas! Mostrando mais uma vez que os japoneses podem ser tremendamente criativos quando querem, "Jagainu-kun" apresenta uma gama de personagens cativantes e, por que não dizer, muito originais, cujos nomes já dão uma boa idéia da mistura vegetal-animal de cada um. Temos um porco-berinjela, pássaros-feijões, um pato-pepino, um morcegorango e talvez aquele que seja o melhor personagem da série: o crocodilo-cebola. Ele é o destaque do anime, com uma voz engraçadíssima e que só aparece para fazer um trocadilho mais ridículo que o outro.


Claro que não adiantaria ter boas idéias apenas para os nomes dos bichos se a idéia visual dos mesmos não ajudasse, mas a criatividade dos membros do Studio Egg estava em alta mesmo. O estilo visual é muito simples e colorido, como deve ser em um anime voltado às crianças bem jovens, e os cenários inventivos são o complemento perfeito para enfeitarem as aventuras da turminha da "Cidade dos Vegetais".

Não se deve esperar grandes arroubos narrativos em um anime destes. Os curtinhos episódios de 3 minutos e meio basicamente mostram pequenas crises de ciúmes entre Jagainu-kun e Haripoteto, confusões muito simples entre os amigos, nada de grandes conflitos, apenas o suficiente para entreter as crianças. Vale mencionar o hilário "Grupo dos Direitos", sobre o qual não farei comentários para não estragar a surpresa.

A mensagem central do anime diz respeito à importância de se ter amigos em quem confiar, da necessidade do companheirismo e de ajudar às pessoas próximas, mesmo que as coisas saiam errado neste processo. Pode parecer uma coisa óbvia para aqueles que já chegaram à adolescência e à vida adulta, mas a julgar pelo comportamento desregrado de várias destas pessoas nos dias de hoje, talvez um anime destes pudesse ter sido muito bem-vindo na infância de cada um.



Ainda que não seja tão "redondinho" quanto "Kogepan" (com o perdão do trocadilho), Jagainu-kun é mais um ótimo anime infantil que fará a alegria das crianças e, creio eu, também dos adultos.


Marcelo Reis


 

Iriya no Sora, UFO no Natsu (OVA)

OBS: Resenha publicada originalmente no Animehaus em 20/03/2007.

Alternativos: Sky of Iriya, Summer of UFO
Ano: 2005
Diretor: Naoyuki Itou
Estúdio: Toei Animation
País: Japão
Episódios: 6
Duração: 25 min
Gênero: Drama / Romance / Sci-Fi


Buscando, consciente ou inconscientemente, seguir os passos do bem-sucedido "Saishuu-Heiki Kanojo", vulgo "SaiKano", a Toei e a Happinet Pictures resolveram investir no anime "Iriya no Sora, UFO no Natsu", baseado na homônima e popular série de romance "sci-fi" escrita por Mizuhito Akiyama. Os livros chegaram inclusive a ser indicados para o Seiun Awards, premiação japonesa voltada para a ficção-científica e que tem, entre seus premiados, ninguém menos que Hiroyuki Morioka, criador do universo Seikai no Monshou / Seikai no Senki. Deixarei as possíveis semelhanças e diferenças entre "SaiKano" e "Iriya no Sora..." para depois. Por enquanto, vamos aos OVAs propriamente ditos.

Produzida em 2005 e contando com 6 OVAs de 25 minutos, esta série começa com uma cena de batalha áerea, na qual uma garota dentro de uma nave solta a enigmática frase: "A guerra já começou, mas ninguém percebe". Nem bem digerimos o que aconteceu e mudamos para um ambiente completamente distinto, uma piscina escolar, perto da qual encontramos Asaba Naoyuki, um estudante querendo aproveitar um pouco seu último dia das férias de verão. Asaba vê uma garota à beira de piscina, a qual se assusta com a presença do garoto e cai dentro d'água.

Asaba não perde tempo, mergulha para salvá-la e, em meio ao constrangimento, acaba pintando um clima entre ambos. A garota, Iriya Kana, possui umas esferas de metal nos pulsos com gosto de eletricidade, seu nariz sangra sem motivo aparente e ela não sabe nadar. Enquanto Asaba dá algumas aulas de natação para a garota, a polícia chega do nada até o local e um adulto simpático, que diz ser irmão de Iriya, leva a garota embora em meio a muito mistério, deixando Asaba intrigado.

O garoto já havia passado por férias para lá de estranhas, investigando uma base área militar próxima à cidade, ao lado do amalucado Suizenji Kunishiro, diretor do clube de jornalismo do qual é membro. Existem boatos de OVNIs voando ao redor da cidade, que se tornam mais fortes em função de um objeto estranho visto com freqüência sobre a tal base. Apesar dos freqüentes exercícios de combate no local, ninguém acredita que uma guerra verdadeira possa realmente ocorrer. Ou, conforme as palavras da garota no início do anime, talvez a guerra já esteja em pleno andamento e ninguém perceba. E, no caso de uma guerra, qual a razão da mesma e quem seriam os inimigos? E onde Iriya e Asaba se encaixariam em toda esta confusão interplanetária?


Iriya no Sora tem muitos pontos em comum com SaiKano: a existência de uma relação amorosa entre um adolescente comum e uma garota com enormes poderes, um conflito armado de grandes proporções que surge inesperadamente, as dificuldades que o jovem casal enfrenta em meio ao tal conflito, e por aí vai. No entanto, o foco encontrado pelo estúdio Gonzo em SaiKano foi muito mais acertado: apesar de alguns escorregões melodramáticos, é palpável a tensão e a sensação de perigo iminente, que segue num crescendo constante até o magnífico final. Iriya no Sora tem muitas qualidades, incluindo um final também muito bom, mas equilíbrio certamente não é uma de suas virtudes.

Comecemos pela animação, que possui algumas partes muito bem feitas mas, no geral, é bem simplista, com cenários chapados e uma movimentação mais tosca. O humor utilizado na série é muito fraco, geralmente aparecendo nos momentos mais impróprios e com um teor idiota que destoa completamente das partes mais sérias do enredo. A honrosa exceção é a cena ocorrida dentro de um restaurante, realmente hilária! A trilha sonora é outra parte bem negativa, em vários momentos não combinando em nada com o que ocorre na tela e impedindo que o público mergulhe nos acontecimentos. Quando a trilha assume tons mais dramáticos nos momentos pesados, não há do que reclamar, mas nas partes cômicas o resultado é pífio. E nem entrarei em detalhes em relação aos clichês e aos diálogos piegas, aliados às psicóticas mudanças de personalidade sofridas por alguns personagens ao longo da série, pois creio que todo mundo já cansou de ler minha opinião a respeito disto. Ainda que em Iriya no Sora estas mudanças tenham uma certa razão para existir em relação à personagem Iriya, não chegam a convencer muito no caso de Asaba.

E é uma pena que estes problemas sejam tão sérios em Iriya no Sora, pois os pontos positivos, que não são poucos, merecem todos os elogios, a começar pelos personagens. Iriya Kana, apesar da saúde debilitada e do jeito suave, é uma jovem de personalidade forte, semblante triste e que sofre por não poder viver como uma adolescente comum em função de suas responsabilidades. Ela não fala muito, mas o pouco que diz vale muito, e é sempre ótimo ver uma personagem feminina em animes que não caia no perfil de gostosona-burrinha. E tudo fica melhor quando outras personagens femininas, como a enfermeira pirada Shiina Mayumi ou a rival de Iriya em relação ao amor de Asaba, Akiho Sudou, também foram bem desenvolvidas pelo roteiro e passam longe de cair nos estereótipos femininos tão comuns em animes. Do lado masculino, Asaba é retratado como um rapaz centrado, mas sem exageros, e em nenhum momento o seu relacionamento com Iriya ou Akiho parece forçado, tudo flui num ritmo muito bom e convincente.

O enredo meio apocalíptico "à la" SaiKano é bom, tem algumas semelhanças com a constante crise entre Japão e Coréia do Norte, e sempre temos a sensação que, mesmo em meio à alegria e ao dia-a-dia normal, algo grande está para acontecer. As desgraças surgem quando menos se espera, e todas as coisas que amamos podem ser levadas de uma hora para outra, sem aviso prévio. Ainda que "Iriya no Sora..." não seja tão pesado quanto SaiKano, possui cenas dramáticas o suficiente para balançar até os machões de plantão.



Mesmo com seus evidentes problemas e perdendo feio quando comparado a "SaiKano", "Iriya no Sora..." é um bom anime, especialmente em função da ótima história de amor entre Asaba e Iriya. Talvez o resultado final tivesse sido melhor caso a produção caísse nas mãos de outro estúdio, mas não dá para criticar muito o trabalho da Toei. Não ficou brilhante, mas também está longe de ser algo execrável.


Marcelo Reis