sexta-feira, março 01, 2013

Narutaru (TV)

OBS: Resenha publicada originalmente no Animehaus em 05/07/2004.

Alternativos: Narutaru ~Mukuro naru Hoshi·Tama taru Ko~, Shadow Star
Ano: 2003
Diretor: Toshiaki Iino
Estúdio: Planet
País: Japão
Episódios: 13
Duração: 23 min
Gênero: Drama / Terror


Lançada em 2003, Narutaru foi uma obra bastante comentada quando exibida na TV japonesa, pela coragem em trazer ao universo dos animes um problema cada vez mais comum no mundo atual: a delinqüência juvenil. Chiaki Konaka, o criativo e talentoso roteirista de obras singulares como Big O, Serial Experiments Lain e Texhnolyze, baseou-se no mangá homônimo de Mohiro Kitoh para criar mais uma história com seqüências fortes. Ao assistir à abertura alegrinha de Narutaru, embalada por uma deliciosa música e mostrando imagens de adolescentes e criaturas coloridas, o espectador tem a impressão de estar embarcando em mais um anime baseado em monstrinhos particulares, como Pokémon & Cia. Por esta razão, é grande o choque quando nos deparamos com uma trama pesada, com direito a mortes violentas e tudo o mais. É uma pena que, no conjunto, o resultado final tenha ficado muito aquém do esperado.

Shiina Tamai é uma adolescente magrela e com um pé gigantesco, que está visitando os avós em uma ilha. Seu pai era um piloto de primeira linha e extremamente corajoso, e Shiina quer ser tão corajosa quanto ele. Em função disto, muitas vezes ela acaba passando dos limites. Certo dia, enquanto se divertia com amigos na praia, Shiina ouve vozes e resolve nadar até um distante portal, mesmo ante os protestos dos colegas. Aos trancos e barrancos, ela chega ao tal portal e encontra um bichinho de olhos enormes, semelhante a uma estrela-do-mar gordinha, mas o cansaço extremo faz com que Shiina desmaie. A morte por afogamento seria certa, não fosse a intervenção providencial do tal bichinho que, entre outras coisas, é capaz de voar (!).

Após o surgimento deste novo amigo, batizado com o sugestivo nome "Hoshimaru" (Estrela Circular), Shiina começa a descobrir outros adolescentes que também possuem "amigos" semelhantes. Estes seres misteriosos são chamados de "Dragonets" e possuem a capacidade de transmitir e receber sensações diretamente para seus "donos", além de poderem se transformar em outras coisas, como mochilas ou até mesmo armas. Nas mãos de pessoas equilibradas, isto não seria um problema, mas quando alguns proprietários de outros "Dragonets" se mostram como delinqüentes com tendências psicopatas, a coisa muda de figura.

Antes dos comentários sobre a série, tenho que falar algo que está engasgado há muito tempo: Hoshimaru é uma cópia quase perfeita de Cartman (South Park)! A todo momento eu ficava a imaginar se Hoshimaru não iria começar a cantar "Kyle Mom´s a Bitch", para só depois voltar a realidade e me lembrar que não estava assistindo a South Park!


Erm... baboseiras à parte, o fato é que Narutaru tinha tudo para ser uma série fantástica. Mesmo com um pano de fundo aparentemente ridículo (estrelas gordinhas que se tranformam em pranchas de surfe, por exemplo), a idéia central é muito boa: mostrar que a maioria dos jovens não é delinqüente porque quer, mas acaba tomando este rumo em função de sérios problemas nos relacionamentos com familiares e colegas, relacionamentos nos quais a falta de suporte, a opressão e o abuso imperam. Alguns jovens caminham para a delinqüência, outros se fecham em seu próprio mundo e muitos, infelizmente, buscam o suicídio.

Um tema complexo como este é apresentado de forma tendenciosa e extremamente simplista em Narutaru, com antagonistas insuportáveis e que se tornam ainda piores em função de péssimos diálogos. Conversas como "Vou dominar o mundo!" e "Todos os adultos, sem exceção, merecem morrer!" são alguns dos cansativos clichês utilizados de forma repetida ao longo de Narutaru. A promissora história acaba se transformando numa bobagem sem tamanho. É verdade que as coisas melhoram bastante rumo ao final, mas isto é algo que tem acontecido em praticamente todo anime do século XXI. Uma obra deve ser analisada no conjunto, não apenas pelos episódios finais, e Narutaru peca terrivelmente neste quesito.

Um outro detalhe incômodo em especial diz respeito aos Dragonets. Eles surgem do nada, participam ativamente do enredo, aos poucos perdem importância na trama, e fica no ar a pergunta: qual a razão da presença deles em Narutaru? Tudo bem, sem a existência deles, provavelmente não existiria uma ameaça real aos adultos mas, sinceramente, a presença de "entidades bonitinhas que vêm sabe se lá de onde nem por que razão" enfraquece sobremaneira o impacto da mensagem central.

Na parte técnica, a mistura de imagens "kawaii" com uma história mais pesada causa uma certa estranheza, mas isto não chega a incomodar. Em compensação, a qualidade da animação chega a ser constrangedora em alguns momentos, com uma mistura bisonha entre 2D e 3D. Os vôos de Hoshimaru são particularmente ruins, mas nada supera a ridícula perseguição de carro no episódio 6, com direito a erros crassos de continuidade e uma solução patética. Confiram e tirem a prova com os próprios olhos.



Triste é perceber que, em alguns momentos, Narutaru oferece seqüências fantásticas, nas quais a capacidade dos jovens em realizar crueldades inomináveis choca para valer. Nestas horas, vemos que Narutaru poderia ter sido um anime realmente marcante, daqueles que ficam na memória por muito tempo. Infelizmente, ficamos com o insosso híbrido no qual Narutaru se tranformou, um anime que não se decide entre fazer rir ou emocionar, divertir ou chocar.


Marcelo Reis


 

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