sexta-feira, outubro 31, 2014

The Dog of Flanders (Movie)

OBS: Resenha publicada originalmente no Animehaus em 31/10/2014

Alternativos: A Dog of Flanders, O Cão de Flandres, Furandaasu no Inu
Ano: 1997
Diretor: Yoshio Kuroda
Estúdio: Nippon Animation
País: Japão
Episódios: 1
Duração: 103 min
Gênero: Drama



Marie Louise de la Ramée, mais conhecida pelo pseudônimo Ouida, foi uma autora inglesa de ascendência francesa, tendo escrito mais de 40 livros durante seus 69 anos de vida. "A Dog of Flanders", escrito em 1872, possui uma peculiaridade interessante. Apesar de se passar na região de Flandres, no norte da Bélgica, a história só ganhou popularidade neste país há poucas décadas. Por outro lado, o livro é imensamente popular no Japão, onde deu origem a várias séries e longas-metragens de animação, assim como nos EUA, onde foram produzidos 4 longas-metragens "live-action" baseados no livro.

Esta resenha diz respeito ao longa animado "The Dog of Flanders", produzido em 1997 pela Nippon Animation e sob a direção de Yoshio Kuroda, responsável também pela direção da série animada de 52 episódios produzida em 1975. Vale lembrar que existem duas versões deste longa-metragem de 1997: uma de 93 min, com muitos cortes e ritmo capenga, lançada pela Geneon Entertainment em DVD nos EUA; e outra original sem cortes, com 103 mins e lançada em DVD apenas no Japão, mas disponível nos EUA num VHS legendado de excelente qualidade, embora difícil de ser encontrado.

Nello é um garoto órfão e pobre da região de Flandres, vive com seu avô Jehaan e seu inseparável cão Patrasche numa área rural próxima a Antuérpia. Nello ajuda seu velho avô nas tarefas rurais e entregando leite nas casas da região, usando para isto uma carroça puxada por Patrasche. Mas sua verdadeira paixão é a arte. Com um talento natural para pintura, Nello deseja se tornar um artista tão talentoso quanto seu conterrâneo Peter Paul Rubens. Sempre que vai à Catedral de Nossa Senhora, em Antuérpia, Nello fica embevecido pela beleza da tela "A Assunção da Virgem Maria", mas seu maior sonho é poder ver os outros dois quadros de Rubens existentes nesta mesma catedral, sempre ocultos por uma pesada cortina. Um sonho distante, já que é preciso pagar uma moeda de ouro para admirar estes quadros, uma verdadeira fortuna para o garoto. Mas mesmo com todas as dificuldades financeiras, seu avô incentiva o talento do neto, que cria seus desenhos na parte de trás de retalhos de pôsteres, por não ter dinheiro para comprar uma tela de pintura.

Apesar da vida difícil, Nello procura manter o alto astral, enquanto tenta curtir as coisas simples da vida com sua grande amiga Alois, filha de um dos homens mais poderosos da região. A diferença social não é empecilho algum para os dois amigos, mas não é difícil imaginar que tal amizade não agrada a todo mundo, em especial ao Sr. Cogez, pai de Alois, que pretende mandar a filha para a escola, para que ela tenha menos tempo livre para brincar com Nello. Elina, mãe de Alois, estimula a amizade da filha com o garoto, mas sabe que a provável separação trará grande sofrimento às crianças.



O que começa como uma singela história de amizade num ambiente bucólico aos poucos se transforma um belo estudo de personagens, no qual mesmo uma pessoa honesta e de bom coração como Nello se torna alvo do desprezo e das intrigas dos mais ricos e poderosos. O destaque aqui vai para Hans, dono da casa alugada pelo avô de Nello. Hans é um tremendo fofoqueiro e fingido, que se regozija em espalhar maldades e mentiras, em especial a respeito do pobre Nello.

O anime ganha força pela sinceridade de seu roteiro e tridimensionalidade de seus personagens. Mesmo aqueles que poderiam se tornar caricatos, como o Sr. Cogez, Hans ou o próprio Nello, não descambam para o maniqueísmo. Os dramas que acontecem não são forçados, e sabendo como a natureza humana pode ser cruel e insensível, não é difícil imaginar que algo parecido pudesse acontecer na vida real, exatamente da mesma maneira.

Visualmente, "The Dog of Flanders" é primoroso. Seu desenho de personagens de traços suaves é bonito e expressivo, lembrando um pouco o estilo do anime "Heidi", ainda que o artista responsável seja outro - no caso, Yoshiharu Sato, também diretor de animação aqui, e que tem no currículo obras como "Romeo and the Black Brothers" e "My Neighbor Totoro". Mas o que realmente impressiona são os cenários: as recriações das paisagens campestres de Flandres e, especialmente, das belas construções de época da Antuérpia são tão maravilhosas que chegam a parecer pinturas. O mesmo cuidado foi dedicado à arquitetura interna de igrejas e palácios, tudo com uma atenção incrível aos detalhes. Um trabalho brilhante do diretor de arte Ken'ichi Ishibashi e sua equipe de ilustradores do Nippon Animation.

A bela trilha sonora clássica de Taro Iwashiro (Rurouni Kenshin Movie) possui um clima melancólico em quase todos os momentos, com algumas sequências que nos remetem a algumas obras sacras de Bach. Esta melancolia vai num "crescendo" constante à medida em que o inverno se aproxima, anunciando mudanças drásticas nas vidas de todos. Destaque ainda para a comovente música de encerramento "When I Cry", cantada em inglês por Dianne Reeves, cantora americana vencedora do Grammy por 4 vezes na categoria "Melhor Performance Vocal em Jazz".

Sem estragar nenhuma surpresa, pode-se dizer que o momento crucial de "The Dog of Flanders" é aquele que se passa num moinho de vento. Tudo neste segmento funciona à perfeição, da animação à trilha sonora, criando um momento cada vez mais angustiante e que terá importância vital nos eventos finais da história.

Muita coisa ainda poderia ser dita sobre o enredo - por exemplo, como surgiu a forte amizade entre Nello e Patrasche - mas é melhor deixar algumas coisas no ar, para que o prazer de assistir ao anime seja ainda maior. Mas preparem-se para o final ao mesmo tempo belo e trágico: mesmo aqueles com coração de pedra terão dificuldades para segurar as lágrimas.



Não há aqui um final piegas e forçado como nos longas-metragens americanos, nem o andamento excessivamente lento das séries de TV. Há um consenso quase unânime de que este longa-metragem de 1997 é a melhor adaptação do livro de Ouida. Palavras não são suficientes para recomendar este belo anime da maneira que ele merece.


Marcelo Reis


 

2 comentários:

  1. nao sabia que site tinha voltado que alegria

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    1. Hehehe, pois é, ainda não esta no ritmo ideal, mas pelo menos continua firme e forte. :)

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